"Cain disse a seu irmão Hevel, e quando estavam
no campo, Cain levantou-se contra seu irmão Hevel e matou-o".
Ao ler este versículo, surge uma dúvida imediata. A
Torá escreve que "Cain disse a Hevel" - então parece haver uma lacuna
bem evidente, uma pausa que nos intriga, porque a Torá não informa o que Cain
falou.
Toda a congregação está sentada ouvindo atentamente a
leitura da Torá, esperando pelo momento do clímax, quando ouvirão o que Cain
tem a dizer, e então, como se uma linha inteira tivesse sido apagada, a
narrativa salta para nos dizer que ele matou o irmão! Mas o que aconteceu? O
que conversaram os dois que fez Cain reagir tão drasticamente?
O Targum Yonatan menciona esta dúvida relatando uma
discussão fascinante que ocorreu entre os dois irmãos, a qual levou diretamente
ao assassinato. Cain reclamou a Hevel que não havia justiça e um juiz supremo
neste mundo; não há Mundo Vindouro, e por isso os justos não serão
recompensados e os perversos jamais serão castigados. Hevel discordou, e como
resultado desta discussão, Cain decide matar seu irmão.
Entretanto, mesmo após ouvir a explicação desta
conversa, a passagem ainda permanece obscura. Se estavam realmente discordando
sobre um assunto tão fundamental, não teria sido informativo se a Torá nos
relatasse isso de maneira direta?
Foi sugerido que a Torá omitisse qualquer menção
explícita do assunto da discussão porque, na verdade, é totalmente
insignificante para o desenrolar da história. Cain não tinha o direito de tirar
a vida de seu irmão, e ponto final, não importa o quanto ele justificasse suas
ações.
Caim e Abel - Escultura em chumbo fundido. Largo
dos Plátanos
O fato de que ele tivesse uma suposta desculpa para
seu comportamento (tinham opiniões conflituantes) era irrelevante, porque
qualquer que fosse seu arrazoado, este permaneceu meramente uma racionalização
formulada pela mente humana, para se permitir a busca de seus próprios desejos
básicos.
Na verdade, Cain estava com inveja porque a oferenda
de Hevel fora aceita por D'us, enquanto que a sua não, por isso desejou matar o
irmão. Ele tinha apenas um problema - sua consciência. Mas não poderia
simplesmente destruir sua própria carne. Precisava de uma desculpa, uma
racionalização para sentir-se melhor a respeito daquilo que estava para fazer.
Por esta razão, provocou uma discussão; descobriu que
seu irmão discordara, e usou isto como uma desculpa para o assassinato.
Entretanto, como era meramente uma desculpa, a Torá considerou-a irrelevante, e
por isso preferiu omiti-la da narrativa.
Quantas vezes inventamos desculpas para justificar
nossas ações - fabricando racionalizações que, se apenas usássemos o tempo
para analisá-las, veríamos que são totalmente infundadas? Somos realmente
honestos com nossos amigos, nossa família, com o Criador, e com nós próprios,
ou simplesmente procuramos as melhores desculpas a fim de satisfazer nossa
consciência?
Ao começarmos este novo ano,
reforcemos nosso compromisso de buscar a verdade e estejamos conscientes das
perigosas racionalizações que inevitavelmente impedirão nossa busca por uma
vida boa e com moral.
Shalom!
Vamos recomeçar a leitura da nossa Torá que começa com a
parashá Bereshit. Esta fala-nos do início, da criação.
Hoje eu escolhi a mensagem” Inveja de Irmão”, que é apenas
uma das muitas mensagens desta parashá e não porque seja uma passagem bonita da
nossa história, mas porque é aquela que continua a ser o motivo de tantas
guerras e de tantas mortes nos dias de hoje, quer seja entre irmãos, entre
amigos, vizinhos ou estrangeiros. A inveja, a arrogância de pensarmos que somos
donos da verdade, a incompreensão, a falta de respeito e a resolução mais fácil
para o problema; o extermínio.
E escolhi-a também, porque acredito que a começar de novo,
devemos começar por tentar resolver o que continua errado. E não, não estou a
falar “ ai e tal, agora vamos mudar o mundo”, não, eu estou a falar de mudar “em
mim”,” em si” e em todos nós, mesmo que seja só um pouquinho para melhor, talvez
não agora, talvez não na geração seguinte, mas um dia, quem sabe possa fazer a
diferença. ZD.
Fontes:
Foto:http://www.pnqueluz.imc-ip.pt/pt-PT/jardins/ContentDetail.aspx?id=16
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