segunda-feira, 29 de setembro de 2014

A origem da oração Avinu Malkeinu


Avinu Malkeinu



Avinu Malkeinu - hebraico: אָבִינוּ מַלְכֵּנוּ ; "Nosso Pai, Nosso Rei", é uma oração judia recitada durante os serviços de Rosh Hashaná e Yom Kipur, bem como nos Dez Dias de Arrependimento de Rosh Hashanah até Yom Kippur. Na tradição Ashkenazi, é recitado em todos os dias de jejum; na tradição Sefardita, é recitado nos Dez Dias de Arrependimento e nos dias de jejum de Yom Kippur e do Jejum de Gedalias*.




Rashi diz-nos que o Avinu Malkeinu (tradução literal: nosso Pai, nosso Rei) como o recitamos atualmente é uma expansão da prece comum, mais curta, composta por Rabi Akiva, sobre a qual o Talmud reporta:


"Aconteceu certa vez durante um período de seca que Rabi Eliezer ficou de pé perante a congregação e recitou vinte e quatro preces por chuva, sem sucesso. Nenhuma chuva caiu. Então o Rabi Akiva postou-se perante a congregação e disse Avinu Malkeinu e sua prece foi imediatamente atendida. Quando os Sábios viram que Avinu Malkeinu de Rabi Akiva era uma prece realmente eficaz, adicionaram-lhe mais pedidos, e instituíram a prece completa como parte do serviço pelos Dias de Arrependimento."






O livro Levush diz –nos que as partes adicionadas aos pedidos originais contidos em Avinu Malkeinu seguem o esquema da Amidá (prece silenciosa). Por esta razão é pronunciado logo depois dela, e de pé com atenção especial. Por isso é também omissa quando Rosh Hashaná ocorre num Shabat, assim como a Amidá dos dias de semana. Outra razão para esta omissão é que contém preces para nossos interesses pessoais, que devem ser deixados de lado no Shabat.



O uso da expressão Avinu Malkeinu, é explicado pelos nossos sábios da seguinte maneira:


Um príncipe foi sequestrado na infância e levado para um país remoto. Ele pode retornar à terra de seu pai sem vergonha alguma pela sua longa ausência sempre que o desejar, porque é para seu próprio legado que ele está retornando. Similarmente, um judeu pode sempre voltar para a Torá, embora tenha estado separado dela por muitos anos, porque é sua herança. Por isso rezamos: "Traga-nos de volta para Sua Torá, nosso Pai," porque D'us sempre nos aceitará de volta quando voltarmos a Ele.


Avinu Malkeinu - nosso Pai e nosso Rei: Como pai, Ele jamais nos negou Seu amor. Como rei, Ele exige a nossa obediência e controla o nosso destino.

Durante os Dez Dias de Arrependimento estes pensamentos deveriam trazer-nos de volta para D'us, e fazer com que nos atiremos aos Seus pés como Seus filhos e Seus servos confessando: "pecamos perante Vós", e implorando - "tende misericórdia de nós".



Fontes:

Texto:

Imagens:

Músicas:

terça-feira, 23 de setembro de 2014

domingo, 21 de setembro de 2014

ASQUENAZITAS





Da Idade Média à Actualidade


Noé na Arca, Folio 521a
Miscelânea Asquenazita do Norte de França, 1277



     Ashkenaz é referido na Bíblia como descendente de Noé. Em Génesis 10:1-4 pode ler-se: «Esta é a descendência dos filhos de Noé: Sem, Cam e Jafet e a estes nasceram-lhes filhos depois do Dilúvio. Os filhos de Jafet: Gomer, Magog, Madai, Iavan, Tubal, Meshec e Tirás; e os filhos de Gomer: Ashkenaz, Rifat e Togarma.» Por sua vez as fontes talmúdicas identificam Germania com Gomer, pai de Ashkenaz. 




O poeta e trovador judeu Süsskind de Trimberg,
Códice Manesse, séc. XIII



   Nos séculos IX-X famílias judias estabelecem-se em cidades como Trèves, Metz, Colónia, Mainz ou Worms, nas margens dos rios Mosela e Reno, dando início ao que se designa por «era asquenazita» da história judaica. No ano 1000, os judeus seriam cerca de 4000 em terras alemãs, contando-se em 20 000 nas vésperas da *Primeira Cruzada em 1096. Entre 1050 e 1300, as comunidades asquenazitas ou «alemãs» proliferam em França, na Inglaterra, nos Países Baixos, na Alemanha, na Suíça e no Norte de Itália. A vida religiosa, jurídica, económica e social da comunidade (kahal) desenvolve-se de forma autónoma. 




Expulsão dos judeus de França, Grandes Chroniques de France, 1321



    Com as expulsões de Inglaterra (1290) e de França (1306 e 1394), os judeus dirigem-se para leste, para a Alemanha, Áustria e Polónia. No entanto, as contínuas perseguições na Alemanha e mais tarde na Polónia/Lituânia dilataram ainda mais a sua dispersão, que se estendeu à Rússia e daí para a Palestina e outras partes do mundo, onde os asquenazitas sobreviveram e construíram novas comunidades.




Mahzor de Worms, 1272



    Os ritos litúrgicos do judaísmo medieval franco-alemão derivam especialmente do antigo corpus palestiniano, em detrimento do babilónico. A sequência e a formulação de muitas orações distinguem-se das orações dos judeus de Espanha, de Portugal e do Oriente. Assim, o rito asquenazita, cuidadosamente transmitido num espírito de grande religiosidade, espalha-se pela Europa Central e Oriental, passando a chamar-se rito polaco. Embora com algumas variantes regionais, actualmente o culto das sinagogas asquenazitas do mundo inteiro baseia-se no rito polaco. Criando uma cultura própria muito rica, o mundo asquenazita incentiva o estudo diário da Torá; surgem comentários inovadores ao Talmude, bem como um estilo de música sinagogal singular. 




Rabino Shlomo Ytzchaki (1040-1105)



     É neste quadro que surge uma das figuras mais marcantes da Idade Média: Rashi, acrónimo de Rabi Shlomo Ytzchaki, o ilustre comentador da Bíblia e do Talmude, nascido em Troye, França. O seu comentário do Pentateuco, que foi o primeiro livro impresso em hebraico, em 1475, em Reggio, Itália, influenciando mais tarde as traduções bíblicas dos eruditos da Reforma, continua a ser nos dias de hoje leitura obrigatória para estudantes e comentadores. 




Capa de “Margaritke” de Hans Christian Andersen, traduzido para yiddish. Kiev, 1919



  Os asquenazitas criaram igualmente língua própria - o yiddish (também chamado judeo-alemão por combinar o hebraico, o aramaico e o alemão), que foi durante cerca de mil anos a sua «língua franca». Nas vésperas da II Guerra Mundial, o número total de falantes de yiddish foi avaliado em onze milhões de indivíduos. Este número reduziu-se a metade depois do genocídio perpetrado pelos nazis.


     Um dos expoentes máximos do movimento literário yiddish foi o escritor Isaac Bashevis Singer, Nobel da Literatura de 1978. Filho e neto de rabinos hassídicos, Singer nasceu na Polónia em 1902 e emigrou para Nova Iorque em 1935. Da sua vasta obra, toda escrita em yiddish, consta literatura para crianças. Um bom exemplo é o livro “Zlateh e o Bode – Outros Contos”, que retrata as tradições do folclore judaico da Europa Central, antes da II Guerra Mundial. 




Os 7 Anciãos de Chelm, ilustração de Maurice Sendak



   Numa das histórias de Zlateh – “A Neve em Chelm” (que decorre durante as festividades de Chanukkah), a acção desenrola-se em Chelm, uma aldeia onde todos os habitantes, novos e velhos, são idiotas. Numa certa noite alguém observa o reflexo da lua num barril de água. Logo os aldeões imaginam que a lua tivesse caído no barril e selam-no, com receio que ela fuja. Na manhã seguinte quando abrem o barril, verificam que a lua já não estava lá. Deduzindo que tivesse sido roubada, decidem chamar a polícia. Como não encontraram o ladrão, os idiotas de Chelm choraram e ficaram de luto por não terem a lua de volta. 



As fotografias de Menachem Kipnis
e o mundo desaparecido dos judeus na Europa



Velhos judeus lendo o jornal no Parque Krasińskich, em Varsóvia



   Menachem Kipnis nasceu em 1878, na Polónia, numa respeitável família hassídica de rabinos e chazanim, e morreu no gueto de Varsóvia em 1942. Foi um dos intelectuais mais populares da Polónia, no período que antecedeu a II Guerra Mundial. Foi também um reconhecido investigador e coleccionador de música popular yiddish. No decorrer do seu trabalho de campo tirou imensas fotografias, que representam a vida dos judeus na Polónia de então. Do seu espólio, destruído durante a guerra, restam as fotografias publicadas no jornal americano-yiddish Forwerts




Associação dos Artistas Judeus de Varsóvia. Um grupo de artistas estuda as últimas peças publicadas na revista americano-yiddish Forwests.




No mercado de Dust




Rapazes de famílias hassídicas de Cracóvia




 Escola de Hebraico para Raparigas, Łaskarzew




Escola de Hebraico para Rapazes, Lublin, 1927




Dança Hassídica em Chanukkah, Marevna, 1970



   O mundo asquenazita está na origem do Hassidismo (não confundir com Chassidei Ashkenaz, movimento místico medieval), um movimento religioso que nasceu na Ucrânia, no século XVIII, e que teve como fundador Baal Shem Tov (1700-1760). Os hassídias são conhecidos pela intensidade das suas práticas religiosas, por um modo de vestir característico, e pela prática da língua yiddish. Este movimento ainda conta com numerosos adeptos nos Estados Unidos e em Israel. 




Música hassídica pelo grupo The Heart and the Wellspring
(“Above all else, guard your heart, for it is the wellspring of life” – Proverbs 4:23)




Moses Mendelssohn (precursor da Haskalah), Anton Graff, 1771



    A Haskalah (da raiz sekhel, inteligência) foi um movimento cultural, que designa a tendência de uma certa intelectualidade do judaísmo europeu dos séculos XVIII e XIX, para se abrir aos valores culturais profanos. Entre outras coisas, os militantes deste movimento advogavam a renúncia ao uso de língua própria em prol da adopção da língua profana do país de acolhimento, e o estudo do hebraico e da Bíblia como disciplinas científicas. 

    Estas aspirações tiveram dois efeitos contraditórios. Por um lado, favoreceram uma tendência cada vez mais forte que conduziu à assimilação dos judeus na sociedade profana envolvente; por outro lado, inspiraram uma busca de identidade judaica, provocando o despertar de ideais nacionalistas modernos. Estes últimos suscitaram o Sionismo, movimento político cujo programa era promover o regresso da nação judaica à sua pátria ancestral, Israel.

     Os asquenazitas também contribuíram significativamente para a formação de três grandes correntes religiosas modernas: o judaísmo reformista, a neo-ortodoxia e o judaísmo conservador. 




Cartaz político, «Czar russo: acaba com a tua cruel opressão aos judeus!», 1904



     Entre 1880 e 1920 mais de dois milhões de judeus russos fugiram da Rússia. Enquanto que uma larga maioria emigrou para os Estados Unidos, outros, movidos pelo ideal sionista, escolheram a Palestina, então sob domínio do Império Otomano. Outros ainda, poucos, imigraram para Portugal.

  Em finais do século XIX, os registos e recenseamentos dos judeus da Comunidade Israelita de Lisboa apresentam nomes como Kastrouski, Kassiliewick, Metrovif, Kamenevski, entre outros. Também em fuga do anti-semitismo chegaram a Portugal, nas primeiras décadas do século XX, judeus vindos da Polónia. 




Lançamento da primeira pedra para a sinagoga de Lisboa, 25 de Maio de 1902



     Predominantemente sefardita no início, a composição da comunidade israelita de Lisboa, vai-se alterando ao longo do século XX: em 1882, apenas 4 dos 113 chefes de família recenseados são asquenazitas. Chegados a 1950, num total de 290 chefes de família recenseados, 164 são asquenazitas.

     Esta proporção que ainda hoje se mantém ficou a dever-se, em parte devido à imigração de judeus russos e polacos, à vinda e instalação definitiva de refugiados da Alemanha, da Áustria e da Europa Central durante a II Guerra Mundial, mas também ao desaparecimento, por assimilação progressiva, de nomes sefarditas.

     Actualmente, o número de judeus asquenazitas ainda é superior na Europa e nos Estados Unidos, por oposição ao Estado de Israel, onde os sefarditas e judeus orientais são a maioria.

     Para terminar este artigo propomos a audição de “Roni, roni bat Zion”, pela Shabbatsong Klezmer Band, num concerto que teve lugar na sinagoga Dohány, em Budapeste. 






Roni, roni bat Zion
Herius Yisrael
Simchi V’alti B’chol Lev
Bat Yerushalayim
(…)
Regozija filha do Sião
Chama de plena voz Israel
Rejubila e canta de todo o coração
Filha de Jerusalém
(…)





Este artigo foi elaborado na integra por,

Sónia Craveiro

 
Muito obrigada J
Beijinhos 




*sobre a Primeira Cruzada ler o artigo “Rinaldo e a Conquista de Jerusalém”


Fontes:

DICIONÁRIO DO JUDAÍSMO PORTUGUÊS, EDITORIAL PRESENÇA

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Cartas de Lisboa | Rosh Hashaná




Rosh Hashaná



Rosh Hashaná é quando se celebra o Ano Novo Judaico, o qual comemora a Criação e nela o nosso propósito.




Na verdade, Rosh Hashaná não é o aniversário do primeiro dia da Criação, mas sim o sexto, o dia em que Adão foi criado. O versículo ao descrever criação Divina de Adão diz-nos que ele foi formado na "imagem" de D'us.




O Rabino Menashe ben Israel, líder Judaico e um rabino nascido em Portugal, na sua obra magistral "Conciliador", aborda a questão óbvia.


"Se D'us não tem imagem ou forma, a que “ imagem” se refere o verso?


Explica o Rabino, o termo imagem neste contexto é utilizado para transmitir uma "mensagem".

É verdade que o mundo foi criado durante um período de seis dias, mas nenhum outro ser reflecte como o ser humano o desejo final de D'us para o mundo.


Podemos pensar como analogia, diz ele, num indivíduo bonito, de pé diante de um espelho.




De modo algum existe qualquer comparação entre a plenitude da vida do ser humano e uma mera forma que é o seu reflexo.


No entanto, há muito que se pode decifrar sobre a pessoa ao ver seu reflexo.


O uso do termo "imagem", transmite a energia Divina e a beleza investida em nós, lembrando-nos das responsabilidades únicas que temos neste mundo.


Sim, Rosh Hashana é o sexto dia na Criação, mas é dia número em termos da visão de Deus para este mundo, visão que nós, que fomos criados à sua "imagem", temos como obrigação implementar.


Shabat Shalom e Shaná Tová!
Cortesia do Rabino
Eli Rosenfeld
chabadportugal.com