FARO
Muralhas da cidade velha de Faro
A cidade portuguesa com cerca de 44.000 habitantes, capital
do Algarve, albergou na época medieval, como outras localidades da região, uma
comunidade judaica.
Conquistada pelos Mouros em 718, esteve sob o domínio
muçulmano até 1249, em que é "reconquistada" pelas tropas de D.
Afonso III, que lhe viria a conceder duas cartas forais em 1266 e 1269.
Na altura do século XIII existia já uma importante
comunidade judaica, tal como testemunha uma pedra tumular datada de 1315 com o
nome de Josef Dotomb, que se supõe ter sido rabino, e que foi encontrada num
espaldão militar onde se situa hoje o Centro Histórico Judaico de Faro.
Extramuros situava-se a Judiaria de Faro, a sul da R. de Santo António e
confinava com a Alagoa.
Porém, a chegada maioritária dos Judeus a Faro, na sua
maioria mercadores, dá-se na época dos Descobrimentos Marítimos Portugueses.
A judiaria de Faro ficava situada no local onde hoje se
encontra o Convento de Nª. Srª. da Assunção (Museu Infante D. Henrique).
A comunidade judaica de Faro foi sempre uma das mais
distintas da região algarvia e das mais notáveis de Portugal, contando com
muitos artesãos e gente empreendedora e destacada por ter sido o berço da
imprensa em Portugal.
De facto, possuía uma oficina de copistas (1391). Uma das
suas figuras mais relevantes foi o tipógrafo Dom Samuel Gacon (ou Porteiro),
quem em 1487 editou o primeiro livro impresso em Portugal, o Pentateuco, uma
obra em língua hebraica fundamental nas sinagogas. O único exemplar conhecido
desta edição ainda em existência encontra-se na colecção permanente da Brittish
Library, em Londres.
O primeiro livro impresso em
Portugal imprensou-se em Faro em 1487 e foi uma edição do Pentateuco (Torá)
escrito em língua hebraica. (Facsimile do Pentateuco
hebraico da oficina de Samuel Gacon)
Em 1492 D. Samuel Porteiro editou também o Talmud,
constituído pelo "Tratado do Divórcio" e o "Tratado dos
Juramentos".
A manifesta prosperidade dos Judeus farenses no século XV é
interrompida pelo Édito emitido por D. Manuel I, em Dezembro de 1496, no qual
os expulsa de Portugal, caso não se convertessem ao catolicismo. Assim,
oficialmente, e só neste sentido, é que em Faro, como em Portugal, deixaram de
existir Judeus.
Ato contínuo, em 1519, no local onde estava implantada a
Judiaria de Faro, na Vila Adentro, foi erigido o Convento de Nossa Senhora da
Assunção.
Vila Adentro
Traços da comunidade judaica de Faro encontram-se também em Fez (Marrocos). Sabe-se também que Judeus expulsos originários de Faro viveram em Baiona, Londres, Dublim e Jamaica durante os séculos XVII e XVIII.
Após o terramoto de 1755 o Marquês de Pombal convidou os
seus descendentes, homens de negócio e mercadores que moravam em Gibraltar e no
norte da África, para regressar a Portugal e ajudar a recuperar a economia
portuguesa.
É deste jeito que no século XIX se estabelece uma nova
comunidade judaica na zona da Rua de Santo António, composta por
aproximadamente 60 famílias, contribuindo para o crescimento do comércio local.
Com a passagem do tempo membros desta comunidade emigrariam para outras
cidades.
Assim sendo, cerca de 1830, esta comunidade judaica
edificou duas Sinagogas, de que já não existem vestígios, e um cemitério.
Prova da prosperidade da comunidade ressuscitada é que o
edifício onde hoje está instalado o Colégio Algarve (Rua Filipe Alistão), foi
residência-palácio de Abraão Amram. A sua importância ficou também patente
aquando a visita do rei D. Carlos e da restante família real a Faro, para a inauguração
da estação ferroviária da cidade. Como o Bispo carecia de condições para
receber o rei, foi Samuel Amram quem emprestou tudo o que ele precisava, mesmo
empregados para o servirem.
Fachada do Colégio Algarve
Com o advento do século XX, começa também o declínio da
pujante comunidade judaica de Faro. As novas gerações de Judeus começaram a
sair da cidade para concluir os seus cursos superiores, indo para Lisboa,
Londres ou os EUA para jamais regressar. Ao mesmo tempo, aconteceu a grande depressão
do final da década de 1920, que levou à falência de muitas das empresas da
região que eram propriedade de famílias judias. Destarte, no primeiro terço de
século a comunidade judaica mal compreendia 50 famílias. Em 1965, vendo o
esmorecimento, Semtob Deiblatt Sequerra, o último líder da comunidade, acertou
com a Câmara local a manutenção do espaço do cemitério, para garantir a
dignidade da necrópole. Em 1970 apenas havia cinco judeus a morar em toda a
província, esmorecendo as duas Sinagogas existentes.
O Cemitério Judaico de Faro, classificado como local de
interesse público no registo de monumentos nacionais, é a única mostra hoje
existente da passagem desta comunidade judaica. O espaço, localizado na zona
norte da cidade de Faro, entre o hospital distrital e o estádio de São Luís, é,
ao mesmo tempo, Centro Histórico Judaico de Faro, que é gerido pela Comunidade
Israelita de Lisboa.
O terreno do cemitério foi adquirido em 1851 pelos líderes
da comunidade: Joseph Sicsu, Moisés Sequerra e Samuel Amram, sendo o primeiro
enterramento o do Rabbi Joseph Toledano (em 1838) e o último o de Abrahám Ruah,
em 1932.
O cemitério foi votado ao abandono até 1990, quando Isaac
Bitton, descendente da comunidade de Faro mas radicado nos Estados Unidos,
visitou o cemitério e ficou chocado com a sua degradação. Ao seu regresso os
EUA, criou a Faro Cemetery Restoration Fund, Inc., organização que no terreno
era gerida por Ralf Pinto, descendente de judeus que fugiram para a Holanda. Em
1993 o cemitério foi reaberto ao público numa cerimónia de rededicação que
contou com a presença do então presidente da República, Mário Soares, que
homenageou assim o contributo da comunidade judaica para o desenvolvimento do
Algarve.
Na ocasião, o Presidente da República portuguesa plantou o
primeiro dos dezoito ciprestes existentes na fachada do cemitério, como
homenagem viva a Aristides de Sousa Mendes, o cônsul português de Bordéus que
salvou 30.000 pessoas do Holocausto.
Em 2003 o cemitério renomeado passando a designar-se Centro
Histórico Judaico de Faro.
Ciprestes na fachada do
Cemitério da Colónia Judaica de Faro.
Fontes:
(Por Caeiro)
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