terça-feira, 13 de novembro de 2012

OS SEFARDITAS NO IMPÉRIO OTOMANO




Mehmed II entra em Constantinopla, 1885, Fausto Zonaro


   Em 1453 Mehmed II conquista Constantinopla, capital de Bizâncio, mais tarde rebatizada Istambul, que viria a ser a capital do Império Otomano. Esta data marca o início da Idade Moderna, pondo fim a cerca de mil anos de Idade Média, período que começa com a queda do Império Romano do Ocidente (476) e termina com a queda do Império Romano do Oriente ou Bizantino (1453).
 

Rendição de Granada, 1882, Francisco Pradilla
 

   Em 1492, com a rendição de Granada, o Islão é expulso da Europa ocidental. Os reis católicos de Espanha, Fernando e Isabel, impõem aos   judeus e aos muçulmanos o exílio ou a conversão. Os judeus que recusam a conversão partem, na sua maioria, para Leste. Alguns optam por Portugal, de onde serão expulsos em 1497. A diáspora dos sefarditas estende-se em pequenas doses à Holanda, Provença, mais acentuadamente à África do Norte, e sobretudo ao Império Otomano, onde são acolhidos por Bayezid II.
 
 

Bayezid II, c. 1578, anónimo, Veneza
 

   O almirante Kemal Reis, comandante naval ao serviço do sultão Bayezid II, tem por missão transportar os judeus e os muçulmanos, expulsos de Espanha, que desejem estabelecer-se nas províncias do Império Otomano. São dezenas de milhares os judeus oriundos de Espanha que se instalam nas cidades portuárias de Istambul, Esmirna, e principalmente Salónica.
 
Welcome, Mevlud Akyildiz
 
   Em 1517 o Império Otomano conquista a Terra de Israel. Começa assim a aliyá* dos sefarditas para a Terra Prometida; estabeleceram-se nas cidades de Jerusalém, Safed, Tiberíades e Hebron.
 
Solimão, o Magnífico, oficina de Ticiano
 
   No reinado de Solimão, o Magnífico, que se estendeu de 1520 a 1566, o Império Turco/Otomano atingiria o seu apogeu. A sua frota podia controlar toda a costa mediterrânica e os seus territórios incluíam a Anatólia, a Arménia, uma parte da Geórgia e do Azerbaijão, o Curdistão, a Mesopotâmia, a Síria, o Hedjaz (com a cidade de Meca), o Egipto, os Estados de Argel, Tunes e Trípoli, a Península Balcânica, a Grécia, a Transilvânia, a Hungria Oriental e a Crimeia.
 
Em cima: navio “Mavna” de Veneza; em baixo: navio-almirante “Göke” de Kemal Reis, Biblioteca do Palácio-Museu Topkapi em Istambul
 
   O domínio destes espaços continentais e marítimos ofereceu uma margem de manobra especialmente propícia ao desenvolvimento do investimento lucrativo nas redes de comércio marítimo entre as duas margens do Mediterrâneo, e muito particularmente entre o Egipto, Veneza e a metrópole do Bósforo. Foi nesta conjuntura que os sefarditas se tornaram, em poucas décadas, uma das forças económicas no trato do Mediterrâneo Oriental.
 
“Anciãos de Israel a serem recebidos por um oficial”, Museu Turco de Arte Islâmica de Istambul
 
   No Império Otomano vigorava o sistema millet, que garantia autonomia religiosa e cultural, mas também administrativa, jurídica e fiscal às diferentes minorias, de modo a estas poderem conduzir os seus assuntos com grande independência. Os judeus, apesar de terem de pagar diversos impostos e contribuições, tinham um estatuto globalmente positivo. O contexto do millet permitiu ainda que os sefarditas integrassem as hierarquias da administração otomana, nomeadamente como agentes da fiscalidade imperial.
 
 
Dervish (monge turco)                                 Padre Grego                                     Judeu otomano




   O pintor franco/flamengo Jean-Baptiste van Mour (1671-1737) ilustrou a grande diversidade étnica do Império Otomano, como se pode observar nas imagens anteriores. Uma das características da diversidade étnica era a diversidade linguística, que viria posteriormente a revelar-se um problema de coesão nacional.
     Com o advento do Iluminismo, dão-se os primeiros passos para a assimilação e perda de identidade associada ao judaísmo tradicional. Em 1860 é fundada em Paris a Alliance Israélite Universelle (Col Israel Chaverim), que foi a primeira organização judaica internacional.
 
Mulheres do Império Otomano, 1873
1 – Noiva arménia; 2 – Mulher judia de Constantinopla; 3 – Jovem grega
 
   Um dos objetivos da Alliance era atuar em toda a parte pela emancipação e progresso moral dos judeus. A partir de 1890 a AIU começou a dedicar grande parte dos seus meios à promoção da educação da população judaica, sobretudo nos Balcãs e no Médio-Oriente. Graças às escolas da AIU, a língua francesa penetrou profundamente nas comunidades judaicas daqueles países, influenciando mesmo o vocabulário da língua judeo-espanhola (ladino) falada naquelas comunidades. Assim, instalou-se a ideia de que a língua francesa era um fator de modernização, sendo o judeo-espanhol remetido para o espaço familiar.
 
     Entre 1829 e 1913, o Império Otomano perdeu as suas possessões nos Balcãs, o que levou a uma vaga de emigração hebraica para fora daqueles territórios. Todavia, para os judeus que permaneceram no espaço turco, a adoção da língua turca tornou-se num fator dominante de emancipação.
 
Um notário turco a redigir um contrato de casamento, 1837, Martinus Rørbye
 
   Quando a República Turca foi reconhecida em 1923, as elites republicanas enfrentaram o enorme desafio de como construir uma Turquia moderna, homogénea e secular a partir daquele mosaico multiétnico, herdado do Império Otomano. Uma das medidas tomadas, e que provocou uma verdadeira revolução, foi a declaração da língua turca como língua obrigatória para toda a república, no ano de 1932. O alfabeto árabe foi abandonado, e em seu lugar foi adotado o alfabeto latino.
     Com o alargamento da escolaridade obrigatória na língua turca, o ladino começa a desintegrar-se. No entanto, o ladino/judeo-espanhol continua a ser um importante legado cultural.
 
 

    Em 2001, a Quincentennial Foundation fundou o Museu Judaico da Turquia. A Quincentennial Foundation é uma organização criada em 1982, composta por 113 cidadãos turcos, judeus e muçulmanos, com o objetivo de comemorar os 500 anos da chegada dos judeus sefarditas ao Império Otomano.
     Para encerrar este pequeno artigo, propomos a audição de uma peça musical composta no século XVII por Dimitrie Cantemir (1673-1723), que para além de compositor e musicólogo, foi um reconhecido intérprete de música otomana. A interpretação está a cargo do Hespèrion XXI, sob a direção de Jordi Savall.
 
     Atualmente, estima-se em 23000 o número de indivíduos da Comunidade Judaica na Turquia. A grande maioria, aproximadamente 95%, vive em Istambul. Os judeus sefarditas representam cerca de 96% de toda a população judaica na Turquia.
 

17 th Century Ottoman Music By Dimitri Cantemiroglu
*Alyiá – Lit. «Subida», emigração para a Terra de Israel
 
 

 
Este foi mais um artigo da já nossa amiga
Sónia Craveiro,
A quem agradeço todo este empenho nesta tão interessante partilha.
Muito obrigada
Beijinhos
 
 
 
Fontes:
Bibliografia:
OTOMANO, IMPÉRIO; ALLIANCE ISRAÉLITE UNIVERSELLE, DICIONÁRIO DO JUDAÍSMO PORTUGUÊS, EDITORIAL PRESENÇA;

 

2 comentários:

  1. Desconhecia grande parte do aqui foi apresentado. É um belo trabalho que esclarece os movimentos dos judeus quando foram expulsos da Península Ibérica.

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  2. Muito interessante , ja visitei Istambul , e antes de chegar li um pouco da historia , mas muito reduzida,acho que o sistema que vigorava, de protecçao ás minorias , cultura , religião , lingua, funcionava , muito bem, e as diversas culturas podiam progredir , criar riqueza , em paz , convivendo , em harmonia , acho o artigo muito bom, obrigada ..........

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