RIBADÁVIA
Vila de Ribadávia
Vila galega de 5.500 habitantes, centro económico e
administrativo da região do Ribeiro. Está atravessada pelo rio Ávia, pouco
antes da sua desembocadura no rio Minho, entre as montanhas da serra do Faro e
a do Suído.
Vista de Ribadávia
Ribadávia surge como núcleo relevante de população no século
XI, sendo capital do Reino da Galiza durante o reinado de Dom Garcia (1065-71).
A chegada da corte galega produziu um efeito imediato de expansão da vila,
constituindo o seu núcleo. O assentamento real na cidade e a sua situação
estratégica atraiu uma considerável quantidade de Judeus, atraídos pelas
possibilidades de negócio. A importância do Reino da Galiza era grande na
época, com umas fronteiras que se estendiam além do Douro, e mesmo com poder de
vassalagem sobre o reino muçulmano de Badajoz.
No século XII produz-se um crescimento demográfico e
económico ligado com a comercialização do vinho do Ribeiro e com a fundação dos
grandes mosteiros de São Clódio, Melom e Osseira e graças ao foral de 1164,
concedido pelo rei Fernando II.
Em 1375, por concessão de Henrique II de Trás-Tamara,
inicia-se o senhorio de Ribadávia, tornando-se em sede do Adiantado Maior do
Reino da Galiza (uma espécie de vice-rei). No alto da cidade acha-se o castelo
dos Sarmento, senhores da vila, do que se conservam algumas ruínas.
Castelo de Ribadávia
A capital do Ribeiro esteve amuralhada, tal como testemunham
ainda restos de panos e algumas portas que se conservam, como a Porta Nova, a
Porta da Vila de Arriba e o postigo da Porta Falsa, que afortunadamente se safaram
da derruba iniciada em 1832 e que se parou por causa das dificuldades
económicas.
Remanescente da muralha de
Ribadávia. Foto de Caeiro
Nessa altura já contava com uma comunidade judaica, cuja
primeira e mais conhecida referência, não da judiaria mas da presença judaica,
é a Crónica de Froissart, escrita nos
finais do século XIV, que ressalta a importância que tiveram os Judeus de
Ribadávia e o alto preço em vidas que pagaram pela resistência que ofereceram
junto com o resto dos habitantes em 1386 face ao ataque das tropas inglesas do
Duque de Lencastre, que assaltou a cidade numa das guerras da libertação da
Galiza.
Posteriormente a esta crónica, os dados sobre a comunidade
judaica de Ribadávia reduzem-se às quantidades pagas em conceito de taxações
específicas que a população judaica devia pagar à Coroa e algumas outras
notícias sobre algumas das personagens que lá viveram.
Pela documentação existente, sabe-se que o número de
famílias hebraicas em Ribadávia situou-se por volta das treze em 1464; sete
entre 1472-74; onze em 1749 e quatro em 1482. A estes dados haveria que
acrescentar as pessoas não sujeitas a tributações. Na altura do século XV a
comunidade judaica de Ribadávia era semelhante à maioria das existentes na
Galiza.
Em 1476 os reis católicos ascendem à casa dos Sarmento a
Condado em reconhecimento pelo labor de Bernardino Peres Sarmento na
reconquista. Muitos Judeus encargavam-se então da gestão dos assuntos
financeiros do senhorio e posteriormente do Condado de Ribadávia,
especializando-se na administração de bens e rendas e em diversos ofícios
artesanais. Também se destacaram como mercadores de vinho.
A documentação existente dos séculos XVI, XVII e XVIII é
suficientemente explícita para permitir localizar a Judiaria de Ribadávia. Trata-se
de documentos referidos a foros, uma espécie de contratos de arrendamento a
longo prazo, ou às vendas de casas, propriedade do mosteiro de Santo Domingo.
Esses documentos falam na localização de diferentes prédios "na rua da
judiaria".
Essa Judiaria de Ribadávia localizava-se entre a praça Maior
e a muralha medieval. Porém, nem todos os estudiosos concordam na extensão
desta zona. Segundo Leopoldo Meruéndano e Benito Fernández Alonso, os Judeus
habitavam entre a Porta Nova de Abaixo e a de Arriba, com o passeio
correspondente da Madalena, para além de uma zona exterior no bairro dos
Ferreiros e da Corredoira. José Luis Lacave situa a Judiaria de Ribadávia na actual
rua de Merelhes Caula mas, com base na obra de Meruéndano, estende o bairro
judeu "ao espaço que existe entre a Madalena, a muralha e as ruinas do
castelo, isto é, às ruas Porta Nova de Arriba, Porta Nova de Abaixo e Travessa
da Porta Nova". Esta delimitação não é compartilhada por Samuel Elján, que
admite que a presença judaica em Ribadávia não era tão grande que permitisse
habitar em quase metade da superfície da vila.
Localização da Judiaria de
Ribadávia. Foto do GoogleEarth
Seja como for, o bairro judeu reconhecido pelo concelho de
Ribadávia (em roxo) é o que abrange a Rua Merelhes /Judiaria, Praça da
Madalena, Rua da Porta Nova de Arriba, Rua da Porta Nova de Abaixo, Travessa da
Porta Nova e Praça de Buxám".
Zonas de âmbito judaico de
Ribadávia. Foto de Eva L. Parguinha
Os arruamentos judaicos de
Ribadávia em cor cinza.
Do bairro judeu de Ribadávia ainda persiste o traçado
medieval das suas longas e estreitas ruas, os seus cantos de ruas e praças,
porteadas pelas sacadas, e pátios rodeados de fachadas. Como uma continuidade
dos prédios, quer pelas ruas, quer pelas arcadas, a pedra é o elemento presente
nesta judiaria. Os mercados judeus localizavam-se nos sotos das casas, evitando
destarte a entrada do sol para comodidade dos clientes e para preservar os
alimentos. As varandas projetam-se para a rua em proeminentes saintes para
proteger os sotos da chuva; de resto, colocavam diante das suas próprias portas
lajeados a jeito de plataformas, elevadas uns centímetros por sobre o nível da
via a fim de evitar que a humidade do solo penetrasse nos locais.
Rua da Judiaria
O eixo principal do bairro judeu de Ribadávia situava-se por
volta da Rua da Judiaria (hoje rua de Merelhes de Caula), que liga a Praça
Maior com a praça da Madalena. Esse foi o nome da rua até o século XVII, pois
posteriormente foi mudado pelo nome de Rua da Cruz. Porém, na documentação, até
a entrada do século XIX, quando se cita a Rua da Cruz aparece sempre a antiga
denominação de Rua da Judiaria, o que permite supor que a rua seria mais
conhecida por esse segundo nome do que pelo primeiro. Na actualidade conserva o
mesmo traçado e recuperou o nome tradicional juntamente com o de Merelhes
Caula.
Placa da Rua da Judiaria
O lajeado da rua e a proeminência das pedras nas casas
contribuem para lhe dar ao seu percorrido uma forte fasquia medieval.
Praça Maior, ao fundo a Rua da
Judiaria. Fotos de Eva L. Parguinha
Ao fundo a Praça Maior de
Ribadávia. - Rua da Judiaria. Fotos de Eva L. Parguinha
Nesta rua existem lojas de artesanato onde as suas montras
destacam diferentes elementos ornamentais judaicos.
Foto de Eva L. Parguinha
Foto de Caeiro
Prédio Judeu – Foto de Caeiro
Praça da Madalena
Foto de Eva L. Parguinha
Foto de Caeiro
Foto de Eva L. Parguinha
Foto de Caeiro
Pr. da Madalena vista da Pr. de
Buxám. Foto de Caeiro
Porta Nova
O Arco situado no limite sul da Judiaria e que permite o
acesso desde a vila até o rio Minho.
Porta Nova. Foto de Caeiro
Na sua aresta direita pode-se constatar a existência de umas
concavidades iguais às existentes na porta da muralha de Melgaço.
Porta Nova do interior da
Judiaria de Ribadávia. Foto do GoogleMaps
Foto de Caeiro
A partir do arco da Porta Nova duas ruas penetram na
judiaria, a Rua da Porta Nova de Arriba e a Rua da Porta Nova de Abaixo.
Prédio no entroncamento da R. da
Porta Nova de Arriba -esq-
e Porta Nova de Abaixo -dt.
Rua da Porta Nova de Arriba
Dentro da judiaria, na Rua da Porta Nova de Arriba, ainda
existe uma casa do século XV e uma porta na fachada de uma outra da mesma
época. Ambas as portas são de arcos de meio ponto realizados com grandes
dovelas e nas suas ombreiras direitas possuem concavidades.
Porta Nova de Arriba. Fotos de
Caeiro
Este prédio no nº 20, é a única habitação que conserva o
pátio interior característico das casas judaicas e que era comum a todas.
Casa 18 Porta Nova
Fotos de Caeiro
Rua da Porta Nova de Abaixo
Rua que discorre paralela à muralha
pela sua face interna.
Fotos de Caeiro
À esquerda a Tr. da Porta. - Fotos
de Caeiro
Fotos de Caeiro
A casa com o número 27 da Rua da Porta Nova de Abaixo exibe
uma estrela de David.
Foto de Eva L. Parguinha
Travessa da Porta Nova
Foto de Caeiro
Nesta rua uma placa lembra o local do nascimento da soprano Ángeles Gulin (1939-2002)
particularmente ligada às obras de juventude de G. Verdi.
Foto de Caeiro
Porta Falsa
Foto de Caeiro
Porta Falsa vista de dentro da
Judiaria. Na dt. a Pr. de Buxàm. Foto de Caeiro
Pr. de Buxám, à esq. a R. da
Porta Nova de Abaixo. Foto de Caeiro
Extramuros
Rua que discorre paralela à face
exterior da muralha.
Foto de Caeiro
Foto de Caeiro
Foto do GoogleMaps
No número 7 da Praça da Madalena acha-se o prédio que pode
ter abrigado a Sinagoga de Ribadávia.
Foto de Eva L. Parguinha
Foto de Eva L. Parguinha
Foto do GoogleMaps
No interior do actual prédio e por trás da sua fachada do
século XVI encontram-se uns muros dos sécs. XII-XIII com arcadas e contrafortes
românicos. Segundo o historiador Xosé Ramón Estévez Pérez, o capitel deste
prédio está ligado com o mundo judaico, já que a existência de quatro pinhas nas
laterais lembraria as colunas de Salomão, a margarida formando uma estrela e os
acantos de sete braços como os candelabros judaicos.
Capitel pertencente ao prédio
onde se acha esteve a Sinagoga.
Foto de Eva L. Parguinha
Além disto, encontrou-se uma cisterna no primeiro andar
destinado a apanhar a água da chuva e que posteriormente caía até à gárgula e que
posteriormente poderia ter sido utilizada para os banhos rituais judaicos.
Porta do pátio da sinagoga. Foto
de Eva L. Parguinha
Na imagem, a porta de acesso ao pátio na zona posterior da
parcela, na que se acha que foi o pátio de reuniões da sinagoga (nº3 da Travessa
da Porta Nova). Cabe referir a semelhança com a porta da possível sinagoga de
Monforte de Lemos.
Prédio onde sediou a Inquisiçom
de Ribadávia.
Foto de Eva L. Parguinha
Para além dos portugueses, para se safarem do Santo Ofício
outros membros da Judiaria de Ribadávia assentaram-se em zonas afastadas da
Serra do Suído (dando origem à comunidade judaica da Granha) ou nos vales dos
rios Ávia e Arenteiro.
Tanto cristãos quanto Judeus contribuíram para a pujança
económica do Ribeiro, que chegou ao seu nível mais alto entre os séculos XV e
XVII, tendo sempre como base a comercialização do vinho, do qual a Judiaria foi
mais proprietária do que cultivadora directa. Para além de mercadores, os
judeus exerceram ofícios ligados ao artesanato, entre os quais os de sapateiro,
alfaiate, ferreiro, talho e ourives.
Para reivindicar o passado judeu, desde 1989 celebra-se a
Festa da História, com as pessoas vestidas à época. Esta celebração já aparece
citada em documentos do século XVIII, mas em 1868 deixou de se celebrar.
Também existe a hipótese da existência de um túnel que
ligaria esta parcela com o rio e que poderia ter sido utilizado pelos judeus
para escapar das perseguições. A localização da parcela permite também a colocação
de uma sala de oração orientada para o leste e com as dimensões apropriadas
para os rituais judaicos.
Depois do édito de expulsão, muitos dos Judeus que moravam
em Ribadávia converteram-se ao cristianismo para poder conservar os seus bens,
além de serem considerados cidadãos de pleno direito. Alguns mantiveram o culto
judaico em segredo, sendo mostra da repressão desdobrada contra eles o famoso Processo
de El Malsín em 1606-10, enquadrado nas várias ocasiões que Ribadávia foi
objeto de actividade da Inquisição contra praticantes do judaísmo.
Os que não renunciaram à sua religião assentaram-se
provisoriamente em Portugal, regressando a Ribadávia quando as perseguições
recuaram, mas fugindo periodicamente para Portugal durante os períodos em que
os representantes da inquisição realizavam as suas inspecções pela região do
Ribeiro.
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