UM
MÉDICO JUDEU PORTUGUÊS
Rua d’Ega, Castelo Branco
Felipe Rodrigues Montalto, também conhecido como Elias Montalto, foi um
médico cristão-novo, oriundo de Castelo Branco. Seus pais, António Aires
(boticário de profissão) e Catarina Aires educaram-no secretamente na fé
judaica. Era sobrinho-neto do famosíssimo Amato Lusitano. Estudou Filosofia e
Medicina na Universidade de Salamanca.
Em Castelo Branco casa com a
cristã-nova Jerónima da Fonseca, que já no exílio haveria de adoptar o nome de
Raquel. O casal teve cinco filhos, todos nascidos em Castelo Branco, dos quais
dois gémeos morrem ainda na infância. Moisés, um dos três sobreviventes, virá a
ser um médico conceituado na Polónia, tendo falecido em Lublin, em 1637.
O Louvre nos começos do
século XVII, Féodor Hofbauer
Não se sabe a data exacta da
saída de Portugal do Dr. Felipe Montalto, mas sabe-se que partiu para Itália,
estabelecendo-se em Livorno a partir de 1598. É nesta cidade que em 1599 converte
um jovem português de Lisboa à fé judaica – Paulo de Pina.
Anos depois vai viver para Veneza, onde
conhece Concino Concini, casado com Leonora Galigai, aia e irmã de leite da
rainha Maria de Médicis. Por recomendação de Concini, em 1606 Montalto parte
para Paris, na qualidade de médico da Corte francesa, sendo então chamado a
observar Leonora Galigai, que se encontrava muito doente. Montalto consegue
curar Leonora, mas o rei Henrique IV não tolera judeus praticantes na sua
Corte.
Veneza em 1565, Civitates
Orbis Terrarum I43
Regressado a Itália, o médico
português fixa-se em Veneza, defendendo livremente as suas crenças judaicas. Publica
nesse ano de 1606, em Florença, a obra Optica
Intra Philosophie et Medicinæ Aream de Visu, de Visus Organo et Objecto Theor,
um estudo notável sobre a anatomia do olho e a fisiologia da visão.
Entretanto, Henrique IV de França morre em
1610, sucedendo-lhe o filho Luís XIII, com apenas 9 anos de idade. A rainha
Maria de Médicis torna-se regente na menoridade do filho, e convida o Dr.
Montalto para seu médico pessoal.
Maria de Médicis, como
rainha regente, em 1611, Frans Pourbus, o
Jovem
Montalto, no entanto, impõe
como condição prévia à aceitação do cargo, a liberdade de praticar a sua
religião. A rainha regente solicita autorização ao Papa, e uma vez esta
concedida, em 1612 Montalto parte para Paris, na companhia da mulher, de dois
filhos, Isaac e Moisés, e de*Saul Levi Morteira, seu *shohet, secretário particular e professor de hebraico dos filhos.
Em 1614, sob a protecção da rainha Maria
de Médicis, Montalto publica a sua principal obra médica - Archipathologia in Qua Internarum Capititis Affectionum, Essentia Causæ
Signa, Præsagia, & Curatio Accuratissima Indagine Disseruntur-, um
estudo sobre as “afecções nervosas e mentais”. Nesta obra, precursora dos estudos
psiquiátricos, Montalto procura a explicação científica das doenças mentais,
rejeitando as justificações demoníacas e aconselha um tratamento com base no
repouso e na psicoterapia.
Casamento
de Luís XIII com Ana de Áustria, Bordéus, 1615, gravura de Adrien Moreaux
Em finais de 1615 realiza-se em Bordéus, o
casamento de Luís XIII com Ana de Áustria (filha de Filipe III de Espanha). Montalto
acompanha a rainha regente, mas no regresso a Paris morre subitamente em Tours,
em Fevereiro de 1616.
Maria de Médicis ordena que o corpo do seu
médico particular seja embalsamado, sendo depois levado para Amsterdão por Saul
Levi Morteira e por familiares do falecido. O Dr. Felipe Elias Montalto foi
sepultado no Cemitério dos Judeus Portugueses, em Ouderkerk ann de Amstel, nos
arredores de Amesterdão.
Cemitério dos Judeus
Portugueses, Ouderkerk aan de Amstel
Elias Montalto deixou uma obra notável, estudada por várias gerações de
médicos. Robert Burton no seu famoso livro The
Anatomy of Melancholy, cita o Dr. Montalto e a sua Archipathologia 85 vezes.
*Saul
Levi Morteira (1596-1660) – Autor do Tratado
sobre a verdade da Lei de Moisés, pertence à Direcção, em Amesterdão, que
aplica o herem (excomunhão) a
Espinosa.
*Shohet – abatedor ritual.
Este
artigo foi elaborado na integra pela minha querida amiga,
Sónia
Craveiro,
A quem
deixo, desde já o meu muito obrigada,
Beijinhos
Fontes:
DICIONÁRIO DO JUDAÍSMO
PORTUGUÊS,
MORTERA, SAUL LEVI, EDITORIAL PRESENÇA;
GUARDA, HISTÓRIA E CULTURA
JUDAICA, MUSEU, ELIE
DE MONTALTO;
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