“A Sinagoga Touro não só é a mais antiga
sinagoga da América, mas também um dos seus mais antigos símbolos de liberdade.
Não há melhor tradição do que a história das contribuições da Sinagoga Touro
para os objectivos de liberdade e justiça para todos.”
John F. Kennedy, Presidente dos Estados Unidos,15 de Setembro de 1963
Ostentando o nome de uma família judaica
luso-americana com raízes em Tomar, a Sinagoga Touro, de Newport, Rhode Island,
foi dedicada a 7 de Dezembro de 1763, no primeiro dia de Hanuká, e permanece
hoje como a mais antiga sinagoga dos Estados Unidos — a única do período colonial
que ainda sobrevive e se mantém em actividade. A congregação foi fundada em
1658 (apenas 4 anos após a chegada dos primeiros judeus portugueses a Nova
Iorque) por judeus sefarditas, na sua maioria marranos e descendentes de
marranos que inicialmente tinham fugido da Inquisição portuguesa e que
escapavam agora de perseguições sofridas nas Caraíbas às mãos dos espanhóis.
Entre os fundadores da comunidade contavam-se
Mordecai Campanal, Moisés Israel Pacheco, Simão Mendes e Abraão Burgos. O líder
religioso chamava-se Isaac Touro — e um dos seus filhos, Judah Touro ficaria
para a história como um dos maiores beneméritos norte-americanos do século XIX.
(…)
Judah Touro, de Newport, Rhode Island, viajou
para Nova Orleães, na véspera da compra de Louisiana. Ele fez uma enorme
fortuna como comerciante, metade da qual ele deu a várias causas e instituições
de caridade. Embora ele tenha feito contribuições significativas para
instituições religiosas judaicas e instituições de caridade, ele também doou
generosamente a pessoas e instituições afiliadas com outras religiões. Quando o
reverendo Theodore Clapp foi expulso da Igreja Presbiteriana em 1832, Touro
entrou em cena e pagou a hipoteca da igreja de Clapps, permitindo-lhe continuar
o seu ministério, sem interrupção.
Inicialmente impossibilitados de construir uma
sinagoga própria, a comunidade de judeus portugueses de Newport reunia-se em
casas particulares nas noites de sexta-feira e nas manhãs de sábado.
Durante o seu primeiro século de permanência em
Rhode Island (a primeira colónia das 13 colónias originais americanas a
declarar independência da Grã-Bretanha), os judeus portugueses prosperaram,
tornando-se artesão e mercadores respeitados na colónia esmagadoramente
protestante. O seu sucesso atraiu um influxo migratória de judeus sefarditas e
asquenazim (judeus da Europa Oriental, com raiz na palavra hebraica Asquenaz,
que significa Alemanha), que se juntaram à comunidade inicial, adoptando em
conjunto os rituais religiosos tradicionais dos judeus de Portugal e Espanha.
Com o crescimento da comunidade veio a necessidade de encontrar um local
permanente para a realização dos serviços religiosos, e para isso voltaram-se
para outras comunidades de judeus portugueses. A primeira resposta veio da
congregação Shearith Israel, de Nova Iorque, a mais antiga do país, que enviou
uma generosa contribuição de £149.060. Outras congregações de judeus
portugueses — nomeadamente da Jamaica, Curaçao, Suriname e Londres —
contribuíram também com ajuda financeira para a construção da sinagoga.
Peter Harrison, o mais famoso arquitecto
americano do século XVIII, ofereceu-se para fazer o projecto do edifício, que
demorou quatro anos a construir, sendo dedicado a 2 de Dezembro de 1763 pelo
rabino da congregação, o luso-americano Isaac Touro.
A cerimónia de dedicação do edifício contou com
a presença de muitos notáveis entre a elite protestante de Newport. A sinagoga
Touro é considerada uma das mais emblemáticas obras de Peter Harrison, entre as
quais se incluem a Kings Chapel, de Boston, e a Igreja de Cristo, em Cambridge,
ambas no estado de Massachussetts.
Com a sinagoga, e um cemitério adquirido anos antes,
a congregação portuguesa podia agora cumprir três das funções essenciais da
vida comunitária judaica — os rituais religiosos propriamente ditos, a educação
das crianças e os funerais. A congregação de judeus portugueses de Newport
escolheu para si o nome de Yeshuat Israel (Salvação de Israel).
Durante a Guerra de Independência dos Estados
Unidos, e por causa do bloqueio britânico ao porto da cidade, grande parte da
comunidade escapou para Nova Iorque. Findo o conflito, a vitalidade da
congregação reacendeu-se. Pelo facto de durante a guerra muitos dos edifícios
públicos da cidade terem ficado danificados, a Sinagoga Touro foi utilizada
também para reuniões da Assembleia Geral de Rhode Island e do Supremo Tribunal
estadual.
Em 1790, a convite do rabino Moisés Seixas, o
Presidente George Washington visita esta sinagoga de judeus portugueses e dias
depois lhes envia uma carta que ficaria para a história, reafirmando os
princípios de igualdade e tolerância religiosa que norteavam a Constituição
americana: “(…) Porque felizmente, o governo dos Estados Unidos, que não
confere sanção à intolerância, nem à perseguição assistência (…)”. Estas
palavras eram escritas um ano antes da Declaração de Direitos, que mesmo assim
apenas se aplicava ao governo federal.
A par da Sinagoga Touro, o cemitério da
congregação de judeus sefarditas de Newport é outro testemunho da dimensão e
peso da comunidade de Newport. No Verão de 1852, o poeta Henry Wadsworth
Longfellow ficou tão impressionado com o cemitério sefardita que o imortalizou
num dos seus mais reconhecidos poemas, publicado na Putnam’s Monthly Magazine,
em Julho de 1854:
Henry Wadsworth Longfellow
The Jewish Cemetery at Newport
How strange it seems! These Hebrews in their graves,
Close by the street of this fair seaport town,
Silent beside the never-silent waves,
At rest in all this moving up and down!
The trees are white with dust, that o’er their sleep
Wave their broad curtains in the south-wind’s breath,
While underneath these leafy tents they keep
The long, mysterious Exodus of Death.
(...)
But ah! what once has been shall be no more!
The groaning earth in travail and in pain
Brings forth its races, but does not restore,
And the dead nations never rise again.
No seu bloco de notas, enquanto caminhava entre
as campas, Longfellow foi escrevendo os nomes dos judeus portugueses ali
sepultados. Professor de Românicas e Línguas Modernas em Harvard, o poeta ficou
fascinado com a conjugação dos sobrenomes portugueses aos nomes próprios
hebraicos que ele se habituara a encontrar na Bíblia.
Escrevendo como um observador externo,
Longfellow seria ainda indirectamente responsável por outra ligação dos judeus
portugueses de Newport à poesia novecentista americana. Inspirada no poema de
Henry Wadsworth Longfellow, Emma Lazarus — ela própria descendente de judeus
portugueses — visita Newport em 1867 e, com apenas 18 anos de idade, escreve um
poema sobre a Sinagoga Touro fazendo-o, desta vez, do lado de dentro da
comunidade judaica sefardita dos Estados Unidos:
In the Jewish Synagogue at Newport
Here, where the noises of the busy town,
The ocean’s plunge and roar can enter not,
We stand and gaze around with fearful awe,
And muse upon the consecrated spot.
No signs of life are here: the very prayers,
Inscribed around are in a language dead,
The light of the “perpetual lamp” is spent
That an undying radiance was to shed.
(…)
And still the shrine is holy yet,
With its lone floors where reverent feet once trod.
Take off your shoes as by the burning bush,
Before the mystery of death and God.
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