Brasil - São Paulo
Os pedacinhos de vidro estão escondidos num depósito desde
Outubro de 2005, uma espécie de lembrança de outros tempos, histórias e lições
que ficaram guardadas na estante da memória. Juntos, formavam imensos vitrais
coloridos, mosaicos com símbolos religiosos. Para as centenas de famílias que
frequentavam a antiga Sinagoga Ohel Yaacov, no centro de São Paulo, antes de
sua demolição por uma incorporadora, esses vidros também significaram uma
ligação com a tradição judaica, algo que o progresso não destruiu nem com
britadeiras.
Todo esse simbolismo dos vitrais será justamente a principal
atracção da nova sinagoga Ohel Yaacov, que está sendo construída na Rua
Cravinhos, no Jardim Paulistano, na zona sul - um dos bairros mais nobres da
capital Paulista. Da velha sede demolida na região central sobraram apenas os
tais pedaços de vidro, que foram preservados e recuperados um por um, caco por
caco, no novo prédio.
De volta às paredes até o segundo semestre de 2011, eles serão
uma espécie de ponte de transição entre o arcaico e o moderno na nova sinagoga,
que agora contará com salas de ensino, centros de palestra, biblioteca,
auditório, área de convivência e espaço para festas.
"Os vitrais são símbolos da evolução, uma lembrança da
tradição, mas também uma ligação com o futuro", diz o vice-presidente da
sinagoga, Abramo Douek. O tempo Ohel Yaacov foi a primeira sinagoga sefardita
de São Paulo, inaugurada em 1929 na Rua da Abolição, no centro. Os judeus
sefaraditas são aqueles cujos ancestrais vieram de países do Médio Oriente,
Península Ibérica e África. Com a degradação do centro paulistano, a sinagoga
foi perdendo frequentadores e importância, até que o grupo Sílvio Santos fez
oferta para comprar o terreno - o objectivo era a construção de um shopping
center, que depois foi trocado para um conjunto residencial, mas que até agora
não saiu do papel.
A relação de Sílvio Santos com a sinagoga Ohel Yaacov
é antiga. O apresentador tinha uma cadeira etiquetada com seu nome verdadeiro,
Senor Abravanel, para assistir aos cultos do templo - as comunidades judaicas têm como costume marcar as cadeiras com o nome de frequentadores que
fazem donativos.
Foi o próprio Senor Abravanel, aliás, quem encontrou o terreno
na Rua Cravinhos para a construção da nova sede - que agora terá 2.737 metros
quadrados, uma sinagoga para 580 pessoas, outra menor, para 100 pessoas, e um
salão de festas para 500 pessoas.
"Ele ajudou-nos a comprar o novo espaço, além de pagar um
preço simbólico pelo outro terreno, deu o pontapé inicial na reconstrução",
diz o rabino Samy Pinto. "A ajuda dele foi essencial. Já concluímos 70% da
obra, mas ainda há muito trabalho pela frente. A nova Ohel Yaacov, como faz
parte da tradição das sinagogas, não será apenas um templo para orações, mas
também um centro cultural para o contacto com as artes, o teatro e a música.
Queremos trazer os jovens de volta."
Em São Paulo, cidade com 29 mil judeus que só recebeu
a imigração em peso durante a 2.ª Guerra Mundial e depois da criação de Israel,
a comunidade judaica parece especialmente preocupada em encontrar o equilíbrio
certo entre manter as tradições e atrair os adolescentes. É o desafio de manter
a tradição kosher na era pop.
Para tentar entender melhor as dúvidas de sua comunidade, o
rabino Samy Pinto tem visitado a casa dos antigos frequentadores da Ohel Yaacov
para avisá-los que, até o ano que vem, eles terão novamente um centro para se
encontrarem.
"Quero conectar de novo as famílias. Eu sou também director
de escola para crianças, e por isso sei da importância da renovação, a importância
de se repensar a linguagem, para falar com os jovens de uma forma
diferente", diz. "A nova sinagoga Ohel Yaacov será como um diálogo
novo, um jeito de receber todas as pessoas sem que haja conflitos de
geração."
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