A Trajectória dos judeus do Brasil
O Brasil conta
hoje com uma população mundialmente significativa de judeus, sendo a
segunda maior comunidade judaica da América Latina
e a décima primeira a nível mundial.
Os judeus no
Brasil colónia
O Brasil
foi palco para a primeira comunidade judaica estabelecida nas Américas. Fator
histórico importantíssimo para os judeus nordestinos, os B’nei-Anussim; ramo
judaico que recentemente tem se destacado na mídia judaica do mundo inteiro como
um verdadeiro “Milagre da Ressurreição”. Pois, são esses registos históricos
que os anussins tomam como referência para fundamentar a sua árvore genealógica
até Jerusalém. Com a expulsão dos judeus de Portugal, logo após a
sua descoberta, judeus convertidos ao catolicismo
(cristãos-novos) já haviam se estabelecido na nova colónia.
Importantes
membros da “comunidade judaica anussim” pisaram na terra quando o
judeu-cristão-novo Pedro Álvares Cabral chegou
em 1500, fazendo
parte de sua tripulação: Mestre João,
médico particular da Coroa Portuguesa e astrónomo; e Gaspar da Gama,
intérprete (que ajudara Vasco da Gama
nas
Índias, onde vivia) e comandante da nau que trazia mantimentos, dentre outros de
menor destaque.
Pedro Álvares
Cabral
Pouco se
sabe ao certo a respeito da vida de Pedro Álvares Cabral antes ou depois da
viagem que o levou a chegar no Brasil. Acredita-se que tenha nascido em 1467 ou
1468—o ano anterior é o mais provável— em
Belmonte, a cerca de 30 km de distância da cidade atual de Covilhã centro de Portugal. Seu pai foi Fernão Álvares Cabral e sua mãe, Isabel Gouveia, ele era um dos cinco filhos e seis
filhas da família. Cabral foi batizado como Pedro Álvares de Gouveia a fim de
desvincularem ele de sua origem judaica patente no sobrenome do pai “Cabral”
(que deriva de cabra – nome código usado pelos católicos para identificarem os
cristãos-novos) e, só anos mais tarde, supostamente após a morte de seu irmão
mais velho em 1503, começou a usar o sobrenome do pai. O brasão de armas de sua família foi elaborado com duas
cabras roxas em um campo de prata. Roxo representa fidelidade e
as cabras derivam do nome de família. No entanto, apenas seu irmão mais velho
tinha o direito de fazer uso do brasão da família.
A família
Cabral ganhou destaque durante o século XIV. Álvaro Gil
Cabral (trisavô de Cabral e um
comandante militar de fronteira), foi um dos poucos nobres portugueses a
permanecer fiel ao rei D. João
I durante a
guerra contra o rei de
Castela. Como recompensa, D. João I
presenteou Álvaro Gil com a propriedade do feudo hereditário de Belmonte onde hoje se encontra a mais
importante comunidade judaica anussim de Portugal – a Comunidade Judaica de
Belmonte.
Criado como
membro da baixa nobreza, Cabral foi enviado à corte do rei D. Afonso
V em 1479, quando tinha cerca de 12
anos. Educou-se em humanidades e foi treinado para lutar e pegar em armas. Tinha cerca
de 17 anos de idade em 30 Junho de 1484, quando foi nomeado moço fidalgo (um
título de menor importância normalmente concedido a jovens nobres) pelo rei
D. João
II. Os registos de suas ações antes de
1500 são extremamente incompletos, mas Cabral pode ter excursionado pelo
norte da
África, tal como haviam feito seus
antepassados e era comum ser feito por outros jovens nobres de sua época. O rei
D. Manuel
I, que tinha ascendido ao trono dois
anos antes, concedeu-lhe um subsídio anual no valor de 30 mil Reis em 12 de Abril de 1497. Na mesma época, recebeu o
título de fidalgo do Conselho do Rei e foi nomeado Cavaleiro da Ordem de
Cristo. Não há nenhuma imagem ou
descrição física detalhada de Cabral contemporâneas à sua época. Sabe-se que era
forte e igualava seu pai em altura (1,90 metros). O caráter de Cabral tem sido
descrito como culto, cortês, prudente, generoso, tolerante com os inimigos,
humilde, mas também vaidoso e muito preocupado com o respeito que sentia que sua
nobreza e posição exigiam.
Mestre
João
João
Faras ou João
Emeneslau, mais conhecido como Mestre João, era um médico, astrónomo, astrólogo
e físico espanhol presente na expedição comandada por Pedro
Álvares Cabral que aportou no
Brasil em Abril de 1500, sendo
considerado por muito tempo como a primeira a chegar em terras
brasileiras.
Médico da
coroa portuguesa, era um dos principais tripulantes de Cabral e um dos que se
sabe que eram judeus - o outro era
Gaspar
da Gama, que
historicamente além de Cabral, se destacariam em meio aos seus por suas
habilidades e destreza no papel que desempenhavam.
No dia
28
de Abril de 1500 ele
teria enviado uma carta para o rei D.
Manuel I em que, como a
Carta
de Pero Vaz de Caminha, fazia
comentários sobre as novas descobertas. Em um dos trechos da carta, escrita na
atual Baía Cabrália, onde realizou os primeiros estudos astronómicos no Brasil,
ao identificar pela primeira vez a constelação do Cruzeiro
do Sul, sugere ao rei
que peça um mapa onde veria a localização das terras onde eles estavam, o que
faria crer que os portugueses já conheciam o território brasileiro.
A Carta
do Mestre João foi descoberta
pelo historiador Francisco
Adolfo de Varnhagen, sendo
publicada pela primeira vez em 1843, na Revista do
Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro , Rio de
Janeiro, 1843, tomo V nº 19.
Fernão de
Noronha
Outro
personagem que ganharia vulto, principalmente para os judeus anussitas foi
Fernão de Noronha, também chamado
Fernando de Noronha, corruptela de Fernão de
Loronha (seu verdadeiro nome) (século
XV - século
XVI) foi um
judeu português convertido ao
catolicismo (cristão-novo) que se tornou
um dos primeiros grandes exploradores de pau-brasil nas terras
recém-descobertas do Brasil pelo reino
de Portugal.
Rico
empreendedor, comerciante e armador, natural das Astúrias, Noronha era
representante do banqueiro Jakob
Fugger na Península
Ibérica. Juntamente com
outros cristãos-novos, comerciantes portugueses, obteve concessão para explorar
os recursos naturais do Brasil durante três anos e em 1503 obteve da Coroa o
contrato para exploração do pau-brasil, a valiosa
madeira de tinturaria. O consórcio financiou a expedição de Gonçalo
Coelho em 1503 que em 24 de
Julho descobriu a magnífica ilha que mais tarde tomaria seu nome. Em 1506, Noronha e os
sócios extraíram das novas terras mais de 20 mil quintais de pau-brasil,
vendidos em Lisboa com um lucro de 400% a 500%. Em 1511, associado a
Bartolomeu
Marchionni, Benedito
Morelli e Francisco Martins, participou da armação da nau Bretoa, que a
22 de Julho retornou a Portugal com uma carga de 5 mil toras de pau-brasil,
animais exóticos e 40 escravos, mulheres em sua maioria.
Como
consequência do contrato e da expedição de Gonçalo Coelho, o rei D.
Manuel I (1495-1521)
doou, em 1504, a Fernão de
Noronha, a primeira «capitania do mar» no litoral: a ilha de São João da
Quaresma, atual Fernando
de Noronha.
Em 28 de
Junho de 1524, foi feito
fidalgo de cota de armas por D.
João III, em Portugal, que já tinham
sido concedidas anos antes por Henrique
VII de Inglaterra. A 23 de
Setembro de 1532 ser-lhe-iam
atribuídas armas novas, distintas das anteriores.
Alguns
atribuem a Fernão de Noronha a mudança dos nomes cristãos de Ilha de Vera Cruz e
Terra de Santa Cruz para Brasil.
O Judeu Caramuru
Nos dez
anos seguintes, outros dois judeus naufragaram perto da costa brasileira e
integraram-se aos indígenas: João
Ramalho e Diogo
Álvares Correia, o "Caramuru",
que serviriam de intérpretes para novos portugueses que foram chegando. No mesmo
período, Fernão
de Noronha extraía
pau-brasil da costa
atlântica; as árvores ficariam conhecidas como "madeira judaica". Muitos judeus
portugueses, procurando fugir da intolerância católica em Portugal, viam no "novo
mundo" a oportunidade de praticar livremente seu culto, incluindo-se aí os
convertidos ao cristianismo que praticavam o judaísmo em segredo - os
cristãos-novos. Martim
Afonso de Sousa era um dos
cristãos-novos que chegaram ao Brasil no século
XVI, como
governante de uma das capitanias
hereditárias.
Mais judeus
pioneiros chegaram ao país na época das invasões
holandesas do Brasil, em 1630, uma
vez que compunham na Holanda uma comunidade
tolerada, razão pela qual os holandeses foram bem recebidos pela comunidade
judaica já estabelecida no Brasil. O Nordeste brasileiro ficou sob o domínio
holandês por vinte e
quatro anos e, neste período, muitos sefarditas se
estabeleceram no país, principalmente em Recife, onde
tornaram-se prósperos comerciantes e fundaram a primeira
sinagoga das Américas; a Kahal Tzur
Israel. Com a expulsão dos holandeses, a maioria dos judeus estabelecidos no
Brasil fugiram para os Países
Baixos ou outras
possessões holandesas, como as Antilhas e Nova
Amsterdão, que
posteriormente seria renomeada como Nova
York após ser
cedidas aos ingleses. Ali fundaram a primeira comunidade judaica dos Estados
Unidos e uma terça
parte desses judeus nordestinos se deixaram assimilar para garantir sua
permanência no Brasil e preservar a integridade moral e física de sua família,
gerando mais tarde os que ficariam conhecidos B’nei-Anussim que hoje lutam pelo
reconhecimento como judeus de nascimento perante o rabinato
israelita.
As últimas
informações sobre a presença destes judeus ibéricos no Brasil datam de meados do
século
XVIII. Nessa época,
com o desenvolvimento da mineração na colónia,
milhares de portugueses se deslocaram para a região das Minas
Gerais, entre eles, um
número considerável de cristãos-novos. Através da Inquisição, muitos desses
sefarditas foram julgados, enviados à Portugal e condenados à prisão. De fato,
muitos desses cristãos-novos não mais mantinham ligações com o judaísmo, mas,
por serem ricos comerciantes e mineiros, eram acusados de praticar judaísmo por
seus inimigos e dificilmente se livravam das condenações da
Inquisição.
No final do
século XVIII, já não havia mais relatos sobre judeus no Brasil. Todos haviam
saído da colónia ou mantiveram-se em sociedades secretas tão bem organizadas que
acreditava-se que os que restaram no Brasil haviam se convertido ao Cristianismo, o que faz com
que muitos brasileiros possuam, mesmo
sem saber, origens em judeus portugueses e espanhóis.
A nova remessa
de judeus ao Brasil
A imigração
judaica no Brasil foi um movimento migratório do início do século
XIX até a primeira
metade do século
XX, especialmente
nas regiões Sul, Sudeste e Norte. O judeu
brasileiro é um brasileiro que possui ascendentes e/ou crença judaica. Também são
consideradas judeus brasileiros as pessoas nascidas no exterior mas radicadas no
Brasil.
|
A imigração a
partir do século XIX
Uma nova
onda de imigrantes judeus, sefarditas, começou a chegar ao Brasil em 1810, vindos
principalmente do Marrocos,
estabelecendo-se na Amazónia, principalmente
em Belém, onde fundaram
em 1824 a mais antiga sinagoga em funcionamento no Brasil e, em 1848, o
primeiro cemitério israelita do país; e em Manaus, onde chegaram
em 1880. Boa parte dos que chegaram no final do século vinham em função da
época
dourada da borracha, e sua vinda
foi financiada pelos que já estavam na região. Cametá, no interior do
Pará, chegou a ter
metade de sua população branca constituída de sefarditas.
As famílias
mais ricas mudaram-se para o Rio
de Janeiro com o declínio
da borracha. Ainda assim, a grande assimilação que tiveram na região, envolvendo
também sincretismo religioso, fez com que a proporção de descendentes de judeus
entre a população branca da Região
Norte (amplamente de
sefarditas) seja a maior
do país. A saga dos judeus amazônidas foi levantada no livro Eretz
Amazónia, de Samuel
Benchimol.
Em fins do
século
XIX, uma outra onda
de imigração judaica já se fazia presente no sul do Brasil, inserida
dentro do fenómeno da grande imigração
no Brasil, que ocorreu
principalmente entre 1870 e 1920. Neste período, cerca de 5,5 milhões de
imigrantes desembarcaram no Brasil, sendo o número de judeus não muito
expressivo, pois estes preferiam imigrar para os Estados
Unidos.
Com a Proclamação
da República do Brasil, uma
Constituição foi promulgada, garantindo liberdade religiosa no Brasil, o que
facilitou a vinda de imigrantes judeus, desta vez um grande número de asquenazes: a maior parte
era proveniente do Leste
europeu, regiões da
atual Polónia, Rússia e Ucrânia. A maioria
desembarcava no porto
de Santos e rumava para a
cidade de São
Paulo onde
rapidamente constituiu-se uma próspera comunidade de comerciantes judeus. Com a
ascensão do nazismo na Alemanha na década
de 1930, formou-se um
maior contingente de imigrantes judeus (asquenazes em sua maioria) rumando para
o Brasil. Além de São Paulo (principalmente no Bom
Retiro), os judeus
marcaram presença no Rio
de Janeiro, no Sul do
Brasil e em outras partes do país. No Rio Grande do Sul possui a fazenda
Philipson, fundada no ano de 1904. Ela é considerada como a formadora da
primeira escola judaica no Brasil e está localizada no município de Itaara ao
lado da BR-158. Posteriormente os imigrantes e descendentes migraram do
Bom
Retiro para regiões
nobres da cidade
de São Paulo, como Higienópolis e Jardins.
No Brasil, os
imigrantes judeus praticamente não encontraram resistência religiosa e ficaram
isentos de preconceito por parte da população local, o que tornou sua adaptação
muito mais fácil que as comunidades judaicas norte-americana e argentina, por
exemplo. Hoje em dia, a comunidade judaica brasileira participa ativamente na
sociedade e estão bastante integrados no país.
Fonte:
Sem comentários:
Enviar um comentário