terça-feira, 12 de março de 2013

ELIAS, O PROFETA



ELIYAHU HA NAVI



Elias, o Profeta, 1927, Fritz Kredel (Haggadah Offenbach)


Este artigo, que é apenas um pequeno apontamento sobre Elias, abre com uma ilustração que representa Elias, o Profeta (Eliyahu ha Navi) na sua qualidade de mediador de paz. Refere-se à passagem de Malaquias 3: 23-24 – “Eis que vos mandarei o profeta Elias, antes que venha o grande e temível dia do Eterno. E ele fará volver o coração dos pais (para o Eterno) através dos filhos, e o coração dos filhos (para o Eterno) através dos pais, para que Eu não venha a desferir sobre esta terra uma destruição completa.”




O profeta Elias anuncia a chegada do Messias, Haggadah de Veneza, 1609


    Habitualmente a Haggadah descreve o profeta Elias soprando o shofar, enquanto conduz o Messias a Jerusalém. Na tradição judaica, Eliyahu é conciliador e mensageiro de boas notícias, como a chegada do Messias (Mashiach ben David) - “Aproximam-se os dias – diz o Eterno – em que escolherei, de entre os rebentos de David, um justo que governará como rei, que prosperará e saberá praticar a justiça e a rectidão na terra.” (Jeremias 23:5)


   O nome Eliyahu é composto pela palavra אלי (Eli, “meu D’us”), sendo as restantes letras יהו, o nome de D’us. No texto sagrado Elias é apresentado como um “Homem de D’us”, recipiente de uma graça divina e dotado de poderes sobrenaturais, que realiza milagres em várias ocasiões; alguns em lugares públicos, outros em ambientes privados. Acima de tudo, Elias é um paradigma do mais puro zelo pela fé judaica. 

Elias ocupa igualmente um lugar importante no Cristianismo e no Islamismo. 



Elijah meeting Ahab and Jezebel in Naboth’s vineyard, 1876, Sir Francis Bernard Diksee


     Elias, o Tesbita, de acordo com o “Livro dos Reis” (Sefer Melachim – I Reis e II Reis), foi um profeta da Terra de Israel (estava esta dividida em dois reinos – o do norte – o reino de Israel, e o do sul – o Reino de Judá), que viveu no século IX a. e. c., no reinado de Acab e da sua esposa fenícia, a rainha Jezabel. Jezabel, determinada em erradicar o culto ao Senhor e em fazer da adoração ao deus Baal a religião nacional de Israel, teve influência em Acab que, evidenciando fraqueza de carácter, mergulhou o seu reino numa crise espiritual profunda. Foi neste contexto que Elias e o seu discípulo Eliseu, defenderam ousadamente a fé no D’us único.

     Elias, convicto de que nenhum deus pagão era superior ao D’us de Israel e dispondo apenas da oração e da fé em D’us como armas para enfrentar o rei Acab e os 450 profetas de Baal, lutou corajosamente para que os israelitas reconhecessem a sua apostasia e assim fossem reconduzidos à fidelidade ao D’us de Israel. Já no Monte Carmelo podemos ouvir o profeta:

«E Elias dirigiu-se a todo o povo e disse: «Até quando ficareis saltitando entre dois pensamentos? Se o Eterno é D’us, segui-O! Mas se é Baal, segui-o! – e o povo não lhe respondeu nada. Então Elias disse ao povo: «Cá estou eu sozinho como profeta do Eterno frente aos 450 profetas de Baal.»
I Reis 18: 21-22





Elias e os profetas de Baal, 1545, Lucas Cranach, o Jovem


     Numa atmosfera de grande densidade dramática, Elias dirige uma prece a D’us, dizendo: «Ó Eterno, D’us de Abraão, de Isaac e de Israel! Hoje será reconhecido que Tu és D’us e que eu sou Teu servo e que fiz todas estas coisas conforme a Tua palavra. Responde-me, ó Eterno, responde-me, para que este povo reconheça que só Tu, ó Eterno, és D’us, e assim Tu farás voltar o seu coração desgovernado.»
I Reis 18: 36-37



É precisamente este, o texto de uma das Árias mais famosas da Oratória “Elijah, Op.70”, de Félix Mendelssohn, que o compositor alemão escreveu para o Festival de Birmingham, Inglaterra, em 1846. Propomos a sua audição, na voz do barítono Dietrich Fischer-Dieskau, no papel de Elias.


 No.14: Aria (bass) ELIJAH: Lord God of Abraham, Isaac and Israel, this day let it be known that Thou art God and I am Thy servant. Lord God of Abraham, oh show to all this people that I have done these things according to Thy word, oh hear me, Lord, and answer me. Lord God of Abraham, Isaac and Israel, oh hear me and answer me, and show this people that Thou art Lord God and let their hearts again be turned.




    O episódio do Monte Carmelo termina com o reconhecimento público do nome de D’us e a matança de todos os sacerdotes de Baal, o que motiva a sanha vingativa de Jezabel. Elias é forçado a fugir para o reino de Judá, para salvar a sua vida. Mas após ter caminhado um dia no deserto, sem comida, nem bebida, cansado e fraco, senta-se à sombra de uma árvore e, desmoralizado, pede a morte. É então visitado por um anjo, que o conforta e lhe sacia a sede e a fome.


     Mendelssohn utiliza neste episódio os três primeiros versículos do Salmo 121, produzindo um coral memorável (a cappella), que ficará conhecido por “Coro dos Anjos”. Vamos ouvi-lo, numa interpretação do coro de rapazes do King’s College de Cambridge.
Salmo 121: 1-3 - Um Cântico de Ascensão. Ergo meus olhos para o alto de onde virá meu auxílio. Meu socorro vem do Eterno, o Criador dos céus e da terra. Ele não permitirá que resvale teu pé, pois jamais se omite Aquele que te guarda





No.28: Chorus ANGELS: Lift thine eyes to the mountains, whence cometh help. Thy help cometh from the Lord, the Maker of heaven and esth. He hath said thy foot shall not be moved; thy Keeper will never slumber.




O arrebatamento de Elias, Guiseppe Angeli (1712-1798)


“E sucedeu que indo eles andando e falando, um carro de fogo, com cavalos de fogo, os separou um do outro, e Elias subiu ao céu num redemoinho. E Eliseu viu e exclamou: «Meu pai, meu pai! Ó carros de Israel e seus cavaleiros!» - e não o viu mais.”
II Reis 2:11-12

     Conforme se pode ler no texto bíblico, Eliyahu ha Navi ao deixar o mundo dos vivos, não desaparece como um comum mortal, mas sobe aos Céus numa carruagem de fogo.


     Na piedade judaica, o profeta arrebatado ao Céu vive no Paraíso, com os anjos, onde lhe é atribuída a responsabilidade de escrivão celestial, escrevendo os nomes dos justos e as suas boas acções no simbólico “Livro da Vida” (Sefer ha Chaim). Eliyahu não é uma personagem do passado: está vivo e acompanha o longo peregrinar de Israel, protegendo os judeus em cada geração; desce à terra em socorro dos necessitados, para nos lembrar que temos direito à esperança na justiça. 




Sobre Vitebsk, 1913-1914, Marc Chaggal


     Na pintura de Chaggal – Sobre Vitebsk (a cidade natal do pintor) -, a imagem de Eliyahu emerge na figura do Judeu Errante, passando por uma majestosa igreja russa e por um edifício vedado e encerrado (aparentemente uma sinagoga). O artista expressa desta maneira a vulnerabilidade da condição dos judeus ao tempo da sua infância, que como ele estavam na iminência de se tornarem refugiados. 




Fol.118v, Circuncisão (detalhe), Miscelânea Rothschild, Itália, c.1450-1480


   Mas Eliyahu não nos visita apenas em tempos conturbados; está igualmente presente nas celebrações, observando de perto as relações dos filhos de Israel com D’us. De acordo com a tradição judaica, Eliyahu é o guardião de todas as crianças judias e acredita-se que está presente em cada ritual de circuncisão – Brit Milah -, testemunhando a entrada de uma nova alma na Aliança entre D’us e o povo de Israel. 




A taça de Elias, 1935, Arthur Szyk


     No Seder de Pessach, é tradição reservar uma taça de vinho para Elias, a Kós Eliyahu, e deixar a porta aberta, para que o espírito do profeta possa entrar. De acordo com a lenda, Eliyahu retira uma gota de vinho de cada Seder no mundo, engarrafando-o de seguida, para depois o distribuir aos judeus pobres que não podem comprá-lo para os seus próprios Sidarim




Havdalah (detalhe), Haggadah Kaufamn, Catalunha, séc. XIV


    “Eliyahu ha Navi” é o título de um hino que se canta nas cerimónias de Brit Milah, do Seder de Pessach, mas também em Havdalah (separação), a cerimónia que é celebrada após o Shabat, para dar início à nova semana.

     Eliyahu ha Navi simboliza um traço de união entre gerações de judeus, através dos tempos. 


Eliyahu ha Navi, Eliyahu haTishbi/Eliyahu, Eliyahu, Eliyahu haGiladi/Bim-hera v’yameinu/Yavo eleinu/im Mashiach ben David, im Mashiach ben David.
Elias, o Profeta, Elias, o Tesbita, Elias, Elias, Elias, O Guiladita/Virá e anunciará, virá e nos trará/O Messias, filho de David, o Messias, filho de David.





Este magnífico artigo foi-nos oferecido pela nossa amiga
Sónia Craveiro,

Muito obrigada querida amiga
Beijinhos




Fontes:







Bíblia Hebraica, Editora & Livraria Sêfer Lda, São Paulo, Brasil

2 comentários: